Quebra-cabeças psicodélico

Foto da exposição "Área 91" do fotógrafo Thales Leite
Foto da exposição “Área 91” do fotógrafo Thales Leite

 

Semana passada aconteceu aqui, em São Paulo, mais uma edição do festival catalão Sónar. O lema dos caras é: “Música, Criatividade e Tecnologia”. 

E por alguns dias, a cidade foi tomada por essas três vertentes: sessões de filmes bem alternativos ligados à música, workshops sobre tecnologia e arte e exposições de fotos como a do fotógrafo Thales Leite, chamada Área 91 (www.area91.art.br), em que ele fotografou a força do tecnobrega paraense e suas máquinas sonoras que mais parecem discos voadores.
Tudo isso culminando em uma noite de shows com produtores que são grandes destaques da música atual como o francês Brodinski, o grande Evian Christ, o brasileiro Zopelar e os ingleses Hot Chip, com o melhor show de indie/rock/dance.
Mas a grande atração foi a dupla The Chemical Brothers.
Falar de um show deles deveria ser a coisa mais fácil do mundo: sou muito fã da banda e já tinha visto noves shows antes.
Mas hoje, quatro dias depois de ter sentido a viagem que foi a apresentação, resquícios da psicodelia atacam meu corpo, e claro que, dessa forma, eu não poderia ser isento em uma crítica.
Pra começar, se você não conhece The Chemical Brothers, entre agora no seu serviço de música, procure e vá ouvindo enquanto lê aqui.
Surgidos em 1989, Tom Rowlands and Ed Simons dão forma ao que hoje é o melhor show que você pode vivenciar. São duas horas de uma música que mistura psicodelia e eletrônica de uma forma única.
A dupla utiliza uma quantidade enorme de equipamentos no palco, computadores, teclados, sequenciadores e tudo mais que dois geniozinhos da música deveriam usar.
Além disso, durante todo o show, projetam imagens absolutamente relevantes que funcionam muito com a música que fazem.
Os bróders químicos, em quase 30 anos de carreira, colecionam não só um sucesso retumbante como prêmios e mais prêmios, o que dá pra perceber num show de duas horas pela quantidade de hits que eles possuem.
Mas veja bem: como são eles ali tocando ao vivo, misturam uma música em outra, montando um quebra-cabeças psicodélico, que leva o público para uma dimensão particular.
Você tá ouvindo aí, como eu te pedi?
The Chemical Brothers não parecem um filho bastardo do Pink Floyd com o Kraftwerk?
Sabe aquele filho que tem pais superbacanas, mas, mesmo assim, tem que ser rebelde? Daí, vai lá e pega toda uma leva de hip hop dos anos 1980 e 1990 e joga no vocal?
Pensa numa coisa dessas! Quem faria isso!
Esses dois caras de Manchester vem fazendo. Ah, e um detalhe, fazia algum tempo já que o bróder Ed Simmons não fazia shows ao vivo, querendo um pouco de conforto e só cuidando das criações e gravações da banda.
Ele voltar ao palco, no show de sábado, foi um presente ao público, o mais legal de tudo foi ver a reação dele, como estava empolgado, e o show teve uma vibe bem peculiar com os dois conversando muito no palco, repensando ao vivo o que fariam e como mixariam e o quanto deixariam a música tocando enquanto sentiam a reação do público.
Sim, eles tocaram Hey Boy, Hey Girl, Galvanize, Do It Again e, claro, o ponto alto do show com Saturate, em que as bexigas de tinta explodem no telão nos momentos altos da música.
Músicas de seu disco novo e mais colaborações com outros artistas, como a minha preferida The Golden Path, em que a voz de Wayne Coyne, dos Flaming Lips, foi lembrada, logo depois de Block Rockin Beats.
Posso afirmar com convicção que o meu décimo show dos bróders químicos, Tom Rowlands e Ed Simons, foi o melhor de todos.
Mas eu afirmo outra coisa: ao final de cada show deles, eu saio com a convicção de que o que eles fazem só melhora com o tempo.
E são 26 anos de estrada e experiência pra melhorar o que pode parecer já perfeito.
E como eles mesmos dizem em uma de suas músicas – numa tradução bem literal: “lembre-se de se apaixonar, não tem nada melhor”.
Nem preciso dizer que eu amo esses caras, né?

FABLIPO

Fabiano Liporoni, é colunista da ABSOLUTMAG
Diretor e roteirista de cinema, faz música pra cinema e escreve sobre
o tema aqui e, desde 2004, no seu blog Já Viu? (javiu.wordpress.com)